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quarta-feira, 3 de março de 2010

AS JANELAS DO VOVÔ!


Lendo o livro "canto de inquietudes" do Rev. ALFA Neto (engraçado, nunca pensei que ele tivesse tanto talento com as palavras, e olha que o conheço a mto tempo) ele citou um dizer do Nelson Rodrigues que me fez refletir durante horas a unica frase: "A televisão matou a janela". Isso lembrou-me o tempo em que eu corria pelo pasto verde e o céu era azul, Sempre havia a ventania forte que quando chegava a noite fazia um enorme frio, as vezes (raramente) o céu ficava cinzento, e eu adorava isso, ficava horas enrolada em um lençol na varanda da casa olhando as fazendas distantes sendo cobertas por aquele lindo céu. Lembrei-me das várias janelas da casa da vóvo e a janela que o Vovô sempre fazia questão de deixar aberta, a janela da infância. Tv desligada o dia todo. Isso porque ele era uma pessoa muito econômica - para não dizer mão de vaca; sempre me indignava com isso, queria poder ver os filmes da sessão da tarde ou aquelas novelas super engraçadas da SBT durante a noite. Por não ter a tv, contetava-me com as inumeras arvores plantadas naquele humilde sitio. Adorava subir na árvore de siriguela, fazia então ali a minha casinha na arvore. No seu tronco a Vovó fez uma gangorra onde as crianças da rua juntamente comigo e minhas primas desfrutavam momentos de alegria. Brincavamos, corriamos, pulavamos cercas, brigavamos e em menos de uma hora já estavamos todas juntas reunidas novamente a brincar.
O tempo corria em nossa volta e nem pecebiamos. A televisão continuava desligada. Deveria talvez estar passando um filme super legal com montros, moçinhas, super herois e principes. O Vô chegava umas 7 horas da feira, super cansado e ligava a televisão para ver as notícias do dia a dia, logo após o jornal já era a hora de deitar-se e não apenas ele, mas todos. Regra é regra.
- Hora de dormir!
- Mas são apenas 21:00h. N em uma novelinha?
- Não, não, não! - Cama.
- Ok.
E ia para a cama super chateada. A novela mexicana deveria estar passando naquela hora, o galã deveria estar beijando a lindissima estrela principal.
O Tio Dindô feixava todas as janelas da casa, mas eu abriria todas elas em meus sonhos; ficava olhando para o teto de telhas morrendo de medo de que saisse uma tarantula (em epoca de inverno elas adoravam aparecer), ficava com as lendas da região e juro que já até cheguei a ouvir a cavala - história da menina que desafiou a mãe e virou metade passaro e metade cavalo; coisas de interior que de tanto se falar não se sabe o que é mito ou real , de fato, o som do passaro a assoviar "cavala" eu ouvi.
Era uma epoca boa, epoca de férias juntava-se toda a família no sitio, os primos dormiam juntos, e as vezes era até possivel com toda a ingenuidade dormir segurando a mão daquele primo que sempre rolava um clima.
Amanhecia, as 6:00h o galo começava a cantar, o vento forte começava a soprar e as janelas já estavam abertas, os vizinhos passavam pelas ruas de pedrinhas, carroças e as senhoras nada discretas começavam a gritar "Bom dia, Tia Chica" (referindo-se a vovó).
Levantava-me, e como não estava na capital demorava a ir tomar banho, afinal de contas eu queria ficar despenteada ao menos uma vez, andar com os pés no chão sentindo a terra molhada da chuva, queria correr, soar, e sinceramente banho é uma coisa muito chata. Hunf!
Familia reunida para o café da manhã, e que saudade tenho do leite da vaca que o vovô trouxerá logo cedo, do queijo requeijão feito da região, dos bolos de aimpin, milho e um que eu sempre odiará, o de Fubá. a banana frita, a banana cozida, os ovos cozidos, os ovos fritos; a preocupação da vovó em alimentar toda aquela gente, o vovô contando seus casos e acasos na mesa, a criançada toda rindo, as filhas tentando acalmar a vovó que se preocupava se o tio carlos já havia se alimentado, ou se o tio Antônio havia tido uma boa noite, ou se a noxa já havia ido comprar as verduras para o almoço, e por se lembrar do almoço a velha se desesperava ainda mas em tentar achar um prato que todos fossem gostar.
O vovô ia trabalhar. Aproveitava-mos para ligar a televisão, e enfim tomarmos banho que embora seja uma coisa muito chata fica-se ainda pior quando se é frio, sem o vovô em casa o banho quente estava liberado, a televisão estava liberada e os poucos gastos se era possivel fazer.
Crianças voltavam a brincar, com novas descobertas, novos medos e novas aventuras; A cachorra derá filhotes, era de uns 6 a 12, sei que cada neto ficou com um para si , e os tratavamos como se fossem gente; as meninas da rua adentravam e começavamos a cantar as cantigas de roda e a pular corda, até lembrei de uma do "abc qual será o nome do seu namorado?" Pulava tão alto, mas não alto quanto os meus sonhos.
E era o som dos sapos, das galinhas, dos passaros, dos cachorros, dos bois, era o som do vento, das folhas das arvores, dos tios, das tias, do choro da criança pequena, da risada das crianças grandes, da vovô a dizer "sai daí menina, quer que o cocô caia bem em cima da sua cabeça", "desçe da arvore menina, quer que a largata de fogo te toque", "toma banho logo, menina".
E o dia passava, a noite chegava, e aos 18 anos eu fico a pensar o que o Nelson Rodrigues queria dizer sobre a televisão matar a janela. E agradeço grandemente ao Vovô mesmo sendo para a economia dos seus bolsos furados, desligar a tv e deixar as janelas abertas.